Maricá dá salto em direção à renda básica universal
Em maio deste ano, durante as comemorações dos 205 anos da cidade, o prefeito Fabiano Horta, do PT, anunciou que, a partir de junho, 50 mil pessoas (cerca de um terço da população do município) passariam a receber uma renda básica de cidadania (RBC) equivalente a R$ 130 por mês. O objetivo é ampliar o programa de modo que, até 2021, toda a população receba o benefício.
A cidade é pioneira na implantação de programas do tipo. Em dezembro de 2015, o então prefeito (2009-2016) Washington Quaquá (PT) propôs para Maricá a iniciativa de se pagar de forma universal e incondicional um benefício a seus habitantes. A iniciativa ampara-se na lei 10.835/04, aprovada por todos os partidos do Congresso e sancionada pelo presidente Lula, que diz que a renda básica será instituída por etapas, a critério do Executivo, começando pelos mais necessitados, até que se torne universal.
Para que o dinheiro seja gasto na cidade, foi criada uma moeda social em um cartão magnético, a mumbuca, nome do rio que atravessa a cidade. O comércio de Maricá aceita pagamentos feitos nessa moeda local (moedas sociais locais são uma tecnologia social de economia solidária já disseminada por 113 localidades do Brasil). Também foi criado um banco comunitário com o objetivo de fornecer microcrédito a taxas de juros zero, na forma de mumbucas que são oferecidas para financiamento de projetos habitacionais ou empreendimentos coletivos, preferencialmente na forma de cooperativas.
Desde 2014, as 14 mil famílias mais carentes da cidade recebem uma renda mínima suplementar ao Bolsa Família. Agora, porém, o programa dará um salto de valor e de amplitude em direção a uma renda básica universal: serão 130 mumbucas para as 50 mil pessoas inscritas no cadastro único para programas sociais do governo federal que têm renda mensal até três salários mínimos.
Tal medida supera em alcance e em valores o próprio Bolsa Família, que não deixa de ser pago pela União às pessoas que mais precisam dele.
Experimentos e projetos piloto de renda básica têm sido implementados em vários lugares do mundo. A maior parte deles não é tão abrangente quanto o programa de Maricá: na Finlândia, o valor pago de € 560 por mês beneficiou 2.000 pessoas por dois anos. A cidade de Stockton, na Califórnia, paga US$ 500 por mês para 125 de seus habitantes. De forma universal para todos habitantes, acontece de maneira muito bem-sucedida no Alasca, desde 1982, e em Macau, desde 2008.
É verdade que Maricá tem um Orçamento municipal incomum, produto dos royalties de exploração de petróleo ao longo de sua costa. A receita anual per capita é de R$ 16.665, três vezes mais do que a da cidade de São Paulo, que é de R$ 5.041.
A RBC é uma entre muitas medidas importantes e inovadoras que os prefeitos Quaquá e Horta introduziram para melhor distribuir essa renda, que, de outra forma, poderia ser capturada de forma regressiva, seja por acionistas da cadeia do petróleo, seja por ineficiência de outras formas de uso do dinheiro público.
Estão ao lado dessa medida outras que tornaram a cidade conhecida por suas políticas inovadoras, como o transporte público gratuito e a instituição de um fundo soberano reservado para momentos de crise ou escassez.
Enquanto a economia brasileira demonstra dificuldade de crescimento e altas taxas de desemprego, em função de ações como essas, Maricá terminou o ano passado com mais de 500 novos empregos formais, número relevante para o contexto do município.
Por todas essas iniciativas, que priorizaram a defesa da renda dos mais necessitados e estão criando alternativas reais de desenvolvimento local e combate à pobreza, os demais municípios brasileiros e até mesmo a União deveriam atentar-se ao exemplo brilhante que vem da costa do Rio de Janeiro e aproxima todos nós da utopia que desejamos para nosso país.
Eduardo Matarazzo Suplicy
Vereador de São Paulo pelo PT, presidente de honra da Rede Brasileira da Renda Básica, senador de 1991 a janeiro de 2015 e doutor em economia pela Universidade Estadual de Michigan (EUA)
Leandro Ferreira
Presidente da Rede Brasileira da Renda Básica
FONTE:
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